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1 de outubro de 2018

Aos cristãos, com amor: #EleNão

"Toda a lei se resume num só mandamento: "Ame o seu próximo como a si mesmo". (Gálatas 5:14).
É com carinho, afeto e respeito à minha trajetória na Igreja Evangélica do Betel Brasileiro em Manaíra, iniciada aos 5 anos de idade e encerrada aos 22. É com carinho, afeto e respeito aos três anos e meio que estive como seminarista, no Seminário do Betel Brasileiro em João Pessoa. É com carinho, afeto e respeito à todos os cristãos, praticantes ou não. Dedico este texto às pessoas que encontrei ao longo do caminho, às relações que construí ao longo dos meus 34 anos de vida.
Viver em comunidade é um desafio para qualquer um de nós, pensar o tamanho desse desafio para um país continental como o Brasil, é refletir sobre nossas realidades tão múltiplas, tão distintas, mas que nos torna um único povo: brasileiro.
Neste momento, há um eco que vem apresentando e defendendo enquanto ideal, uma única forma de ser, de existir e de estar neste mundo. São discursos que praticamente estão removendo o espaço para a reflexão, removendo também a possibilidade de nos reconhecemos naqueles que julgamos diferentes.
As vezes, tentar fazer essa reflexão quanto à diversidade cultural do nosso país, pode parecer uma tarefa inviável para alguns de nós, uma vez que esta proposta vem sendo sabotada e taxada/rotulada por ter um caráter "ideológico". Fazendo uso do termo que tem sido utilizado para gerar fissuras, rachaduras e tornar inviável o nosso convívio enquanto povo.
Por isso, proponho pensar acerca dessa nossa diversidade, num contexto mais "próximo", porém, também desafiador que é o universo também diverso das Igrejas Evangélicas em nosso país. Quem não faz parte desse universo, reconhece com tranquilidade esse mosaico que pertence às igrejas evangélicas. Mas quem é, ou foi parte desse contexto, tem uma maior dimensão do quão múltiplo e "infinito" é este território.
Pensar na diversidade dessas comunidades, é reconhecer essa pluralidade de perspectivas e interpretações, dentro de uma única igreja. O modo de perceber os dogmas, tem por finalidade propor um modo de vida, um modo de ser cristão.
E quando voltamos nossos olhos para as comunidades de fé, essa diversidade ganha uma amplitude incrível. Temos alguns nomes de igrejas para pensar no tamanho desse universo cultural: Igreja Batista, Igreja Assembleia de Deus, Igreja Deus é Amor, Igreja Universal do Reino de Deus, Igreja Presbiteriana, Igreja Luterana, Igreja Congregacional... e por aí vai.
Só em ler os nomes dessa igrejas, algumas pessoas já conseguem visualizar esse panorama plural que determinar formas de compreender, anunciar e viver a fé cristã. Reconhecer a diversidade interna, pode ajudar cristãos não apenas a reconhecer a diversidade também existente em nosso país, mas respeitá-la. A igreja evangélica tem seus debates, discordâncias e "Inimizades" internas. Algo que sempre achei contraditório quando considerava a mensagem que percebemos enquanto central do cristianismo:
"Um novo mandamento lhes dou: Amem-se uns aos outros. Como eu os amei, vocês devem amar-se uns aos outros. Com isso todos saberão que vocês são meus discípulos, se vocês se amarem uns aos outros". (João 13:34,35).
Neste momento, percebemos que uma parcela significativa da maioria das igrejas evangélicas, independente de suas dominações, estão ressoando um único discurso quanto ao cenário político do nosso país. Há um envolvimento gigantesco de líderes religiosos, pastores, missionárias, cantores/artistas e grupos de louvor/música gospel, fechados num acordo/apoio com um candidato específico. Há algum problema em declarar apoio à um candidato? Entendo que não e defendo o nosso direito de assim fazê-lo.
Porém, o discurso desse candidato que está sendo não apenas acolhido, mas reproduzido dentro das igrejas evangélicas, é completamente contrário aos ensinamentos e vida de Jesus Cristo.
Sabemos que historicamente, inúmeras pessoas e grupos ao redor do mundo fizeram referência ao nome de Jesus para cometer atrocidades contra a humanidade. A escravidão, por exemplo, foi justificada por protestantes e católicos com base em textos bíblicos. No contexto dos Estados Unidos, mesmo com a criminalização da escravidão, cristãos brancos não aceitavam dividir os mesmo espaços que as pessoas negras. Desse modo, fora instalada ali a segregação racial que se estendeu por quase toda década de 1970, perseguindo, humilhando, torturando e matando pessoas negras.
Contudo, Martin Luther King, um pastor protestante negro, levantou sua voz contra aquele regime desumano, defendido e empreendido por pessoas que anunciavam a fé cristã. Num movimento popular, homens e mulheres negras, decidiram boicotar o transporte público, já que permanecer sentado enquanto uma pessoa branca ficava de pé, era considerado crime. Isso só aconteceu depois que uma mulher negra (Rosa Parks), foi presa, algemada e teve o seu julgamento marcado por simplesmente se recusar a ceder seu lugar a uma pessoa branca.
“Quero assegurar a todos que trabalharemos com vontade e determinação para fazer prevalecer a justiça nos ônibus da cidade. Não estamos errados. Se estivermos errados, a Suprema Corte desta nação está errada. Se estivermos errados, a Constituição dos Estados Unidos está errada. Se estivermos errados, Deus Todo-Poderoso está errado.” (Martin Luther King).

Infelizmente, pessoas negras, indígenas, quilombolas, mulheres e homossexuais - por exemplo - ainda são tratados com muito preconceito e violência não apenas no Brasil. Algumas igrejas históricas dentro do contexto protestante e a própria igreja católica já reconheceram erros outrora cometidos por líderes em outros tempos.
"Bem-aventurados os pacificadores, pois serão chamados filhos de Deus." (Mateus 5:9).
Muito me preocupa esse cenário, onde líderes evangélicos estão militando em favor de um candidato que abertamente fala em aniquilar/fuzilar seus adversários políticos. Dizendo que "minorias devem se curvar às maiorias ou desaparecer". O mesmo declarou ser a favor da tortura e prestou homenagem à um torturador em plenário, condenado pela justiça por sequestro e tortura.
Enquanto isso, o símbolo dessa campanha é um gesto que feito com as mãos, simula uma arma de fogo. Esse gesto tem sido reproduzido por seus apoiadores nas redes sociais, nos comícios e carretadas. Quem não lembra da criança nos braços do candidato? O momento em que ele ensinou como a menina deveria reproduzir o gesto que simboliza um revólver. Quando questionado, disse que aquela era sua marca registrada, que representava o cristianismo e o povo de bem.
Tem mais um ponto que eu gostaria de destacar. Entre tantos outros discursos de ódio proferidos pelo candidato, tem um que me chama atenção. O ódio aos imigrantes e refugiados. Mais uma vez, o texto bíblico é categórico quando nos faz lembrar da fuga de Maria e José para o Egito a fim de preservar a vida de Jesus, que estava sob ameaça de morte por determinação do rei Herodes.
" (...) um anjo do Senhor apareceu a José em sonho e disse-lhe: "Levante-se, tome o menino e sua mãe, e fuja para o Egito. Fique lá até que eu lhe diga, pois Herodes vai procurar o menino para matá-lo". Então ele se levantou, tomou o menino e sua mãe durante a noite, e partiu para o Egito." (Mateus 2:13,14)
Não há como sustentar a ideia de que o apoio a este candidato se dá ou se justifica por um ato de fé, ou de amor à Jesus Cristo.

Não há espaço na vida de Cristo para o ódio, a violência, a perseguição de "adversários", nem tão pouco para a ameaça daquilo que é percebido enquanto indiferente. O tempo que passei dentro da igreja me foi suficiente para decidir o tipo de pessoa que quero ser. Trago comigo, na minha vida aquilo que percebo enquanto ponto central da vida de Cristo, o amor, a compaixão, a empatia, a misericórdia. Esse é o meu desafio diário: amar. E hoje ver essa mensagem de empatia e transformação social, ser sequestrada, torturada e silenciada por tanto ódio, é não apenas doloroso, mas assustador.
"Mestre, qual é o maior mandamento da Lei?" Respondeu Jesus: " ‘Ame o Senhor, o seu Deus de todo o seu coração, de toda a sua alma e de todo o seu entendimento’. Este é o primeiro e maior mandamento. E o segundo é semelhante a ele: ‘Ame o seu próximo como a si mesmo’. (Mateus 22:36-39).
Também não consigo ver coerência no discurso de uma pessoa que se diz cristã, abrir mão da essência do cristianismo, que é "o amor ao próximo" a fim de pleitear uma guerra contra outras formas de crer e de viver. Digo isso considerando mais uma vez o texto bíblico:
"Não por força nem por violência, mas pelo meu Espírito." (Zacarias 4:6).
Se alguém pretende "ser luz" neste mundo, é importante considerar que os dogmas e os preceitos da fé que você pratica, pertence à você e sua comunidade. Imagine se cada religião tivesse como projeto impor sua forma de ver e perceber a existência à toda sociedade. Imagine você ter que seguir os preceitos de uma fé/religião que você não escolheu. Como se sentiria? Para tanto, vale lembrar quem foi e como viveu Jesus, a fim de não propagar um discurso que silencia, desconstrói, criminaliza e nega tudo quanto Cristo anunciou.
Percebi nas religiões divergentes, um discurso comum: Vencer o mal com bem. Que nessas eleições, você possa lembrar do caminho que você trilhou, dos caminhos que os teus pais e teus avós percorreram para que você pudesse estar aqui. Que possamos lembrar das injustiças que o nosso povo sofreu ao longo da história. Que possamos lembrar das violências que o povo negro no nosso país sofreu e ainda sofre. Que possamos olhar com a atenção para as mulheres da nossa vida. Que o nosso voto não seja conivente com a injustiça.

Que o nosso voto não seja uma reprodução do ódio, da violência, da humilhação, do abuso, da tortura e do preconceito.
E quem sabe assim, possamos perceber o nosso lugar social e ver o nosso país enquanto uma comunidade imensa, que de fato é.
E quem sabe assim, a gente possa se reconhecer no outro, e decidir aceitar o desafio de Cristo que diferente de muitos dos que falam em nome dele pregando o ódio, sempre pregou o amor.
Além do #EleNão, você tem outros 11 candidatos. 
Um abraço afetuoso.