Com o
passar do tempo, a gente se dá conta de que a vida passa e passa rápido...
É a idade
que vai chegando de repente;
São as
conquistas que testificam que não somos mais crianças sem responsabilidades,
nem planos...
Outrora,
são os nossos pais antes adultos provedores, agora “idosas crianças”
dependentes.
São
algumas pessoas muito queridas que marcaram nossas vidas e que hoje passamos
anos sem ver.
É a vida,
é o tempo, são as lembranças que passam com os momentos tão sutis que nem se
deixam perceber.
Assim a
gente aprende à lição que o ato de se prender a detalhes, situações, momentos
ou lembranças que não nos fazem bem é simplesmente perder tempo, transformando
nossas vidas em uma viagem longa, aonde a paisagem vai ficando sem graça, pouco
atraente e nada agradável.
Se dar
conta de que o tempo passa e passa rápido...
Se dar
conta do quanto à vida é breve, é muito mais que perceber a constante
possibilidade de se deparar com a morte.
No
entanto, acredito que tal percepção nos revelará um novo tempo, nos guiará por
um caminho de transformação, modificando não apenas a maneira como enxergamos a
existência, mas modificando plenamente nossa maneira de vivermos a vida.
Vamos
tentar aqui refletir um pouco a respeito do despertar para a brevidade da vida,
antes quero deixar bem claro que a nossa proposta por meio dessa reflexão não é
pensar na morte, mas pensar numa maneira de viver melhor os nossos dias. Essa
nossa reflexão vai acontecer no partilhar das nossas experiências, experiências
essas que nos levaram e continuarão a nos levar por esse caminho de descobertas
e transformação interior.
Você já
esteve perto ou acompanhou alguém que recebeu um inesperado diagnóstico de
câncer? Conheceu ou teve alguém na família vítima fatal em algum acidente de
trânsito? Já passou pela experiência de sobreviver a um grave acidente e por
meio dessas experiências, foi levado ou levada a refletir sobre as coisas que
de fato importam na vida?
Talvez
seja você esse alguém que sentiu na pele e viveu esse desafio. Pois bem, ter em
mãos um diagnóstico preciso de que você ou alguém muito querido está portador
de uma doença como o câncer, é de fato um choque à primeira, segunda, terceira
e quinta vista. É a sensação do chão que some dos nossos pés, do mundo que
desaba sobre as nossas cabeças... A brevidade da vida se apresenta, bagunçando
nossa rotina, modificando nossos planos, roubando nosso sono, mudando nossa
vida, nossa forma de ver a vida, nossa forma de viver a vida. Essa mudança
tente em nos tornar humanos melhores...
O
cronômetro foi acionado, a largada foi dada, nossa corrida contra o tempo está
em plena atividade. Disparamos como bala de revólver, obstinados em alcançar o
nosso alvo: prolongar nossos dias de vida. A batalha contra uma doença desse
porte é de fato árdua e nos toma por completo. A guerra está declarada, estamos
na luta pela vida. Tudo o que nos é possível está investido: nosso tempo, nossa
força, nossos recursos financeiros, nossa crença e fé, nossa esperança,
perseverança, confiança, nossa lágrima, nosso sorriso, nosso amor e afeto. E
aquilo que aparentemente não está ao nosso alcance e que antes era impossível,
hoje não é tão difícil assim. Recorremos a quem podemos, perdemos alguns medos
e constrangimentos. Precisamos unir forças ao redor dessa causa. Movemos o
mundo para o alcance desse objetivo.
Noites
sem sono, noites onde desabamos diante do esgotamento físico e mental... Tudo,
absolutamente tudo se torna secundário, o que importa agora é a vida preservada
daquele que está doente. Confesso que por vezes são movimentos quase que
insanos, ou poderia dizer, voluntários, automáticos. Na verdade o nosso
instinto de sobrevivência entra em ação.
O
paciente se submete a exames dolorosos, o que nem de longe pode ser comparado
como uma prévia para o tratamento. O tratamento contra o câncer pode parecer
algo cruel e paradoxalmente desumano; talvez haja essa sensação pelo simples
fato de nos desnudar diante dos outros e principalmente de nós mesmos. A
quimioterapia funciona como uma bomba atômica (palavras ditas por pacientes em
tratamento), o incomodo físico é de tirar o sono e paciência, há a sensação de
explosões internas, o corpo está sendo varrido, o corpo está sendo curado, mas
as reações durante o tratamento leva o corpo a parecer mais doente. É a pele
que fica avermelhada, descascando, é o corpo que dói, é a mente que se torna
inquieta, as emoções que ficam desorganizadas e alteradas, é o cabelo que caí,
é o corpo abatido, é o humano conhecendo sua impotência, sua fragilidade, suas
limitações, suas dependências, sua beleza e magnitude.
Somos
levados (paciente e acompanhante/família) para um casulo, lugar que de fato não
escolhemos estar, são horas a fio dedicadas numa quimioterapia, praticamente um
dia inteiro com os remédios e outras drogas, as reações são diversas,
dependendo de cada organismo, queda da pressão arterial durante a ministração
do medicamento, ânsia de vômito, tonturas, reações alérgicas, entre outros. Meu
pai sorria, cantava e contava piadas durante o tratamento, a sala onde ele
recebia o medicamento era a maior do hospital e sempre lotada, boa parte dos
pacientes em tratamento, entravam no “embalo”... Enquanto o medicamento era
administrado, uma leveza e alegria contagiavam aquela sala, a força de viver
tornava tudo mais leve e esperançoso.
Percebemos
que nenhum de nós é super-herói, somos todos iguais, limitados e desejosos de
viver a vida que nos pertence. É possível ouvir de alguns pacientes numa
condição como essa que simplesmente deveria ter dedicado mais tempo à sua
família, ter dito a eles o quanto os amava, ter abraçado e brincado com os
netos. Há um despertar para a brevidade da vida e sua implicação, há uma nova
perspectiva a cerca da existência, há um abrir de olhos para uma nova realidade.
Perder
alguém que amamos é no mínimo doloroso, a saudade nos faz enxergar sempre a
possibilidade de ter aquela pessoa presente, possibilidade esta não mais real,
ao menos no plano que estamos. Logo reconhecemos que o tempo antes vivido
poderia ser aproveitado de outra maneira, mais intensa, mais leve, agradável,
feliz e cheia de afeto. Que essa reflexão, oferecida pela vida não nos guie por
um caminho de opressão e lamento, mas que a saudade de alguém que se foi, que o
susto tomado na estrada, que o diagnóstico de uma doença que ameaça a morte,
nos faça despertar do sono existencial e que os nossos olhos da alma deslumbrem
o horizonte de possibilidades que a vida de fato é.
Em vez do
lamento, viva a gratidão.
No lugar
do remorso, viva o amor.
No espaço
da culpa, haja a alegria de viver e perdão generoso.
Que os
nossos dias se tornem mais iluminados e que a luz da sabedoria, do respeito, da
tolerância, da felicidade e do amor, nos conduza por um caminho de paz e
realização.
“Então,
de repente, sem pretender, respirou fundo e pensou que era bom viver. Mesmo que
as partidas doessem, e que a cada dia fosse necessário adotar uma nova maneira
de agir e de pensar, descobrindo-a inútil no dia seguinte - mesmo assim era bom
viver. Não era fácil, nem agradável. Mas ainda assim era bom. Tinha quase
certeza...” (Por Andreza Oliver...).
Continua...